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‘Julgar reação da vítima é injusto’: Como acolher mulheres após o assédio

Existem diálogos que só reforçam o sentimento de culpa da vítima – que já nem deveria existir. Veja como criar um lugar seguro e acolhedor para ajudar

Por Juliana Morales 18 mar 2023, 10h02

Antes de sair do BBB23, ao lado de MC Guimê, que também foi expulso do programa por assédio sexual, Cara de Sapato questiona Dania Mendez (a vítima dos assédios) a respeito do que ela tinha dito à produção. Imediatamente, a mexicana, em choque, começa a se desculpar e repetir que não havia feito nenhuma denúncia.

O programa deu uma aula – no pior dos sentidos – sobre o que acontece quando uma mulher ou menina é assediada. Sim, a culpabilização da vítima é muito comum, até nos casos em que os agressores são punidos. Veja o exemplo de Dania, que saiu do seu país de origem e veio fazer um “intercâmbio” no reality brasileiro.

Mesmo após retirar a mão de um homem que tentava alisar seu corpo e falar não na tentativa do outro de beijá-la, a participante ainda sentiu culpa pelo que aconteceu na festa. Vale frisar aqui que excesso de álcool não justifica qualquer um desses atos, ok?

A decisão de expulsar os dois participantes foi importante para que essas violências não se repitam no programa. Mas a produção do BBB poderia ter pensado em outras maneiras mais acolhedoras de lidar com a situação, fazendo com que Dania entendesse melhor o que rolou e não se culpasse.

Para nós, aqui de fora do reality, também vale muito a reflexão. Qual é a melhor maneira de acolher uma amiga, prima, irmã, conhecida ou qualquer mulher que tenha passado por um assédio sexual? Como criar um espaço de confiança, sem reforçar ideias misóginas?

A CAPRICHO conversou com a Lilian Lacerda, psicóloga coordenadora no Me Too Brasil – organização não governamental (ONG) que atua no enfrentamento à violência sexual no Brasil. A especialista em saúde da mulher explicou e deu conselhos para lidar com essas situações.

Pratique uma escuta acolhedora

A primeira coisa que é importante a ser feita é ouvir genuinamente. E isso significa escutar sem emitir juízo de valor em relação à vítima. Deixe ela contar e evite, por exemplo, fazer questionamentos do tipo: “Como que você permitiu isso?” ou “Por que você não fez ou não falou nada na hora?”.

Agora, se a pessoa ainda não estiver confortável para desabafar, não force a barra. Quando verbalizamos uma violência ocorrida, imagens mentais do dia aparecem, fazendo com que ela “reviva” um dia tão difícil. Só quem passou pode saber quando está pronto para expor.

Frases para mostrar empatia e segurança:

“Eu sinto muito por essa situação que aconteceu com você”

“Isso não deveria ter acontecido com você”

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“Lembre-se: você é a vítima”

“Você gostaria de compartilhar o que aconteceu?”

“Como que eu posso te ajudar?”

Não critique as reações da vítima

Outro erro é tentar se colocar na situação, reproduzindo frases como:  “Ah, se fosse comigo, a pessoa ia ouvir um monte” ou “Se fosse eu, reagiria de tal maneira”. Somos seres singulares que reagimos de maneiras diferentes.

Além disso, é preciso lembrar  que o nosso cérebro tem uma resposta automática em situações de perigo. Portanto, não dá para planejar ou controlar qual vai ser a resposta para uma momento difícil, como sofrer um assédio.

Lilian explica isso, de forma resumida e simples: existe um componente no nosso cérebro que é responsável pela transmissão de informações. E quando acontece uma situação de estresse, que é gerada por um ameaça de perigo, o nosso corpo vai ativar o nosso cérebro. A reposta pode ser: a luta, a fuga ou o congelamento. Então, se a pessoa não consegue ter reações em situações de perigo, isso é normal.

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“Julgar a reação ou não reação da vítima é muito injusto, porque ela fez o que o seu cérebro conseguiu reagir naquele momento para se proteger”, ressalta a psicóloga.

Quando alguém invade o nosso corpo, precisamos ressignificá-lo. Por um momento perdemos o controle dele e precisamos pegar de volta. Então é importante que a vítima seja protagonista de suas escolhas após o assédio”

Lilian Lacerda, psicóloga coordenadora no Me Too Brasil

E nem as escolhas…

Assédio ou importunação sexual são crimes que constam no Código Penal Brasileiro. Denunciar é muito importante. Mas a escolha de quando fazer isso é da vítima – claro, sempre levando em consideração o estado físico e mental dela. Quando ela se sentir confortável para fazer o boletim de ocorrência e tomar medidas legais, mostre apoio, oferecendo companhia para ir à delegacia, por exemplo.

Mais frases que você deve evitar:

“Vai passar, não precisa chorar”

Para passar por situações difíceis, todo ser humano precisa lidar com emoções. É um tipo de luto mesmo. Então é importante liberar o que está doendo e se abrir mesmo.

“Nossa, eu não acredito que isso aconteceu com você! Que horror”

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Mostrar-se muito surpreso ou horrorizado ao ouvir a história da vítima pode soar com desaprovação, causando até certa censura. É preciso ter cautela!

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Verifique como está a rede de apoio

Além do apoio da família e amigos, fala para vítima sobre a existência de ONGs e unidades de saúde que oferecem suporte psicológico. Afinal, ajuda profissional é muito importante nesse momento. Se a pessoa violentada for uma criança ou adolescente incentive a conversa com os pais sobre o tema, com exceção dos casos em que os agressores são os próprios parentes.

Em casos de importunação sexual e estupro, a vítima deve acionar a Polícia Militar ligando para 190 e também pode fazer a denúncia no Centro de Atendimento à Mulher pelo número 180 ou à Guarda Municipal número 153. O Disque-Denúncia também está aberto a esse tipo de caso (número 181), além o Disque 100 de Direitos Humanos.

 

 

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