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5 momentos em que a política se fez presente por meio da moda

Desfile-protesto de Zuzu Angel, look de Pabllo Vittar, campanha eleitoral de Francia Márquez e mais

Por Sofia Duarte 9 mar 2024, 10h00

Moda sem propósito social e sem significado político é apenas um pedaço de tecido. A moda importante de verdade reflete um comportamento de determinado período histórico e, mais do que isso, serve como linguagem não-verbal e ferramenta para comunicar uma intenção. Essa mensagem pode variar, mas é possível observar na história várias vezes em que abordou assuntos relacionados ao meio ambiente, herança ancestral de um povo esquecido, liberdade feminina, ativismo LGBTQ+, entre outros. 

Aqui, destrinchamos 5 momentos em que a moda e a política caminharam juntas, seja através de um desfile-manifesto pensado por um estilista ou da presença de uma artista no tapete vermelho de uma premiação. 

5 momentos em que a política se fez presente por meio da moda

1971 – Zuzu Angel

Zuleika de Souza Netto, mais conhecida como Zuzu Angel, é considerada pioneira quando se fala de moda no Brasil. Isso porque ultrapassou a profissão de costureira comumente atribuída a mulheres em uma época em que a moda era dominada por homens e ganhou o título de primeira estilista brasileira mulher. Esse feito, por si só, já relaciona sua trajetória com política, mas ela se destacou e se mostrou ainda mais revolucionária durante o período da ditadura militar.

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Seu filho Stuart Edgard Angel Jones, integrante do Movimento Revolucionário Oito de Outubro (MR-8), grupo de luta armada contra o regime militar no Brasil, foi capturado, torturado e assassinado em maio de 1971, aos 26 anos. Após a busca pelo filho cessar com a notícia de sua morte, Zuzu continuou procurando pelo corpo do jovem, mas seu paradeiro não foi revelado, e, em setembro daquele mesmo ano, ela organizou um desfile-protesto no Consulado Brasileiro em Nova York. A estilista mineira usou a moda como ferramenta política ao apresentar uma coleção que denunciava o autoritarismo e as atrocidades cometidas pelo governo ditatorial brasileiro. Nos vestidos de modelagem ampla, trouxe bordados de canhões, anjos mortos e pássaros em jaulas e, para encerrar a apresentação, Zuzu apareceu usando preto como símbolo de luto, além de um cinto todo de crucifixos e um colar com anjo pendurado.

Com suas denúncias e buscas incessantes pelo corpo do filho, Zuzu Angel virou alvo da ditadura e foi assassinada pelo Estado brasileiro em 1976, quando seu carro foi interceptado e jogado a uma altura de 10 metros na saída do Túnel Dois Irmãos, em São Conrado (RJ). A estilista deixou um legado de luta, valorização do Brasil como fonte de inspiração e matéria-prima para suas criações e até hoje é vista como pioneira no uso da moda e do desfile como forma de manifestação política.

Zuzu Angel
Zuzu Angel Instituto Zuzu Angel/Divulgação

2019 – Pabllo Vittar

Pabllo Vittar foi ao MTV Europe Music Awards de 2019 para fazer história – ela levou o prêmio na categoria ‘Melhor Artista Brasileiro’ e se tornou a primeira drag queen do mundo a ganhar o EMA. E, como se não bastasse, a artista aproveitou o cenário internacional e ainda trouxe visibilidade para as manchas de óleo que apareceram em praias nordestinas naquele ano. 

Ela usou um look criado pelo estilista Rober Dognani composto por body floral de mangas bufantes embaixo de vestido de látex preto todo recortado, como referência ao vazamento de óleo, desastre ambiental que precisava (e ainda precisa) de atenção do poder público tanto para resolver e monitorar os ambientes e pessoas afetadas como para investigar suas possíveis causas.

Pabllo Vittar no tapete vermelho do MTV EMAs em 2019
Pabllo Vittar no MTV EMAs em 2019 Daniele Venturelli/WireImage/Getty Images

2020 – Kamala Harris

Kamala Harris fez história ao se tornar a primeira mulher e a primeira mulher negra eleita vice-presidente dos Estados Unidos em 2020. Em eventos de campanha e aparições oficiais naquele ano, a até então candidata chamou atenção por uma peça específica que a acompanhava em todas as ocasiões – um tênis All Star, da Converse

Fora a característica óbvia do conforto, tão caro em uma rotina corrida do dia a dia, a escolha do sapato não era à toa, pois carregava uma mensagem por trás. O tênis pretendia mostrar que Kamala é uma mulher desconstruída do salto alto, que faz parte do ideal de feminilidade, e, mais do que isso, a aproximava de quem mais consome esse calçado, o público jovem. Assim, o item contribui para a construção de uma imagem um pouco mais acessível de uma política que queria se mostrar disponível para escutar o povo.

Kamala Harris usando tênis All Star da Converse durante campanha presidencial dos EUA
Kamala Harris usando tênis All Star da Converse durante campanha presidencial dos EUA Ethan Miller/Getty Images

2022 – Francia Márquez

A atual vice-presidente da Colômbia na gestão de 2023 a 2026, Francia Márquez, utilizou o vestuário como ferramenta política durante sua campanha eleitoral ao lado do então candidato à presidência Gustavo Petro. A intenção da ativista ambiental e primeira vice-presidente negra do país foi a de resgatar e preservar a memória cultural de suas origens afrodescendentes, celebrando sua ancestralidade com roupas de estampas africanas. Ocupar um cargo de poder sem curvar-se aos padrões estéticos eurocêntricos foi uma decisão consciente que a fez deixar evidente a devoção pela sua própria terra.

Além disso, o responsável por vesti-la foi o jovem estilista negro e colombiano Esteban Sinisterra Paz, decisão que pode ser entendida como um incentivo à juventude e a novos criativos na moda.

Francia Márquez, vice-presidente da Colômbia
Francia Márquez, vice-presidente da Colômbia Andres Cardona/Bloomberg/Getty Images

2023 – Day Molina

A Nalimo, primeira marca indígena do Brasil, comandada por Day Molina, se propõe a ser uma marca ativista, comprometida com o meio ambiente, que atua em defesa da Amazônia e feita 100% por mulheres – por esses motivos, o trabalho da estilista já representa uma posição política de descolonização na moda.

Em dezembro de 2023, ela apresentou a coleção ‘Ciranda’ durante a Casa de Criadores, evento que celebra a moda autoral nacional, como forma de celebrar uma manifestação popular protagonizada por mulheres e unir suas raízes pernambucanas, a espiritualidade e a resistência da luta feminista. Na passarela, vimos um casting todo feminino composto por mulheres que fazem parte do dia a dia do ateliê da marca e até consumidoras. O resultado foi uma diversidade de mulheres indígenas, brancas, negras e quilombolas. 

Ao final da apresentação, as modelos apareceram erguendo placas com frases como ‘O futuro é ancestral’, ‘Até que todes sejamos libres’, ‘Afeto, ação, política’ e ‘Raízes profundas, revolução subterrânea’. A diretora criativa da marca surgiu com um megafone para passar um recado: “Nós, mulheres, estamos mudando o mundo. Essa revolução começou há muito tempo e tem ganhado cada vez mais força. E a gente transforma o mundo pouco a pouco, e é isso que eu tenho feito na moda, usado a moda como uma ferramenta de ativismo, de luta, de comunicação”, disse.

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Nalimo apresenta coleção 'Ciranda' na Casa de Criadores 53
Day Molina, estilista da Nalimo, apresenta coleção ‘Ciranda’ na Casa de Criadores 53 Zé Takahashi/ @agfotosite/Divulgação
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