e Vargem Grande do Sul, cidade de 40 mil habitantes no interior de São Paulo, Marina Costa enfrentou olhares depreciativos quando anunciou, ainda no colégio, que queria cursar moda. “Isso foi visto até como um ultraje, algo meio doido”, lembra. Mas ela não desistiu e foi fazer carreira na capital paulista. Anos depois, fundou a MNISIS, marca que trabalha a ideia de um ‘design afetivo’ e explora memórias da adolescência da estilista, e, agora, após desfilar no São Paulo Fashion Week no ano passado, abre sua primeira loja física.
Em entrevista à CAPRICHO, Marina Costa, diretora criativa da MNISIS, recorda sua trajetória e reflete sobre as dificuldades de se fazer moda no Brasil.
Marina consumia muito a CAPRICHO e outras revistas quando era criança e foi influenciada pelo interesse de sua mãe por moda, que contava as histórias da avó costureira. Durante o Ensino Médio, fez curso de corte e costura e tomou a decisão de estudar moda na faculdade. “Meus pais vêm de um lugar muito humilde, eu sou a segunda mulher da minha família que não é analfabeta. Para eles, era importante ter uma segurança de carreira. Por isso, a notícia foi vista como um ultraje, algo meio doido”, relata. Então, ela se mudou para São Paulo aos 18 anos, se formou na FAAP, e a MNISIS surgiu depois que Marina morou na Itália para fazer uma pós-graduação em design de moda e marketing.
Ao voltar para o Brasil, trabalhou como stylist e produtora de moda e, então, criou a própria marca em janeiro de 2020. Em meio à pandemia de Covid-19, conseguiu produzir, de casa, acessórios de forma artesanal que evocavam a essência da etiqueta e acabaram viralizando nas redes sociais. “Eram nostálgicos e divertidos, não queria que fosse uma nostalgia triste. Eu queria a ideia de ‘Uau, sou criança de novo, posso brincar'”.
Um tempo depois, a estilista começou a incluir roupas em seu portfólio e trouxe a ideia do ‘design afetivo‘, que incorpora suas experiências pessoais e emocionais e também é um jeito de se fazer moda sustentável. “Por exemplo, a gente fez o vestido inspirado em casa de vó que é para você ver e falar: ‘Nossa, eu não vou descartar essa peça, porque ela me faz sentir ter uma nostalgia da minha infância’, sabe? Você faz essa conexão com a peça e cria um afeto por ela, e esse é um dos pilares da marca.”
“Toda vez que eu vou criar eu tento pensar na Marina de adolescente, do que ela gostava e do que do que era importante para ela. Esse lugar que a gente busca inspiração é no inconsciente das meninas adolescentes“, completa.
A estilista ainda afirma que a MNISIS é um ‘complexo de lugares e referências’. “Ao mesmo tempo que eu tive uma base que era muito simples, eu vim para São Paulo estudar na FAAP. Então, toda essa dualidade eu tento até hoje aplicar na marca, e, como vargengrandense eu fico muito orgulhosa de onde eu cheguei.”
A moda tende a ser um lugar de muitos homens criando para mulheres. Essa é a verdade. E eu quero vestir mulheres e me ver nelas.
Marina Costa, estilista da MNISIS
A coleção mais recente foi feita em parceria a Brocki, marca de upcycling também comandada por uma mulher, Lucila Serrano. “Eu procuro sempre trabalhar com mulheres. Isso para mim é muito importante, porque a moda tende a ser um lugar de muitos homens criando para mulheres. Essa é a verdade. E eu quero vestir mulheres e me ver nelas. Eu quero criar uma conexão próxima a essas mulheres”, declara Marina.
A marca fez seu primeiro desfile presencial no São Paulo Fashion Week no ano passado, em que a estilista apresentou a coleção ‘Vazio’ e encerrou o show ao lado de sua mãe e a cantora Liniker. Mas os planos de colocar uma nova apresentação como aquela de pé ficam para o ano que vem; no momento, a ideia é concentrar os esforços na primeira loja física da MNISIS, que fica no bairro de Perdizes, em São Paulo, para aproximar os clientes da marca. “Quero conhecê-los melhor e quero que eles me conheçam melhor”, diz a jovem estilista.
Sem contar que, além disso, fazer moda independente no Brasil exige muito esforço. “Para um desfile, é difícil fazer com que as roupas fiquem prontas a tempo. A nossa cadeia de produção brasileira ainda é muito defasada. Eu prezo muito por acabamento, e é difícil, porque você quer entregar um produto bem feito. Fazer isso tudo num período de dois meses de apresentar uma coleção coerente é uma loucura. Fazer moda é caro, criar uma coleção é caro. E é muito caro você fazer isso sem um patrocinador, como é o meu caso. Então, eu preciso de vendas, e para vender também existe um investimento. Todo esse processo administrativo é difícil. Eu fiz moda e eu achei que eu só iria criar, mas eu também preciso empreender.”
No entanto, ela garante que desistir ou estagnar não são palavras presentes em sua trajetória. “Eu sou uma pessoa esperançosa. Eu acredito que é errando que a gente acerta. A valorização da moda brasileira não aumentou, mas pelo menos estamos questionando isso, porque se você tá questionando, você liga uma pulga atrás da orelha, e isso já é um começo. Eu espero que o brasileiro comece a ver que também é legal apoiar pequenas empreendedoras brasileiras, e não apenas grifes de fora.”
“Eu sou o tipo de pessoa que quando a situação é difícil me dá mais vontade, eu gosto de ser desafiada. Eu sou ambiciosa e sempre fui. Se eu não tivesse sido ambiciosa, eu não teria saído da minha cidade para vir aqui tentar abrir uma loja física. Você tem que vender a sua imagem, vender a imagem da sua marca e criar uma comunicação e de verdade. Eu estou pronta para isso e vou lutar e tentar conquistar tudo isso. É difícil, beira o impossível, mas vou tentar o máximo para entregar o melhor que eu tenho”, finaliza Marina, com a esperança que um design afetivo a fornece. <3