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Elayne Baeta comenta identificação com o público através da poesia

"Você descobre que aquele dia que você mais se sentiu sozinha, foi o dia que outra pessoa mais se sentiu sozinha também", compartilhou a autora

Por Anny Caroline Atualizado em 13 jul 2022, 06h45 - Publicado em 12 jul 2022, 22h30

Na lista de livros nacionais mais vendidos no estande da Galera Record durante a Bienal do Livro de São Paulo de 2022, não há dúvidas de que Elayne Baeta conquistou o público com seus dois títulos já lançados. O Amor Não é Óbvio, seu primeiro romance, e Oxe, Baby, sua publicação de poesias, já somam mais de 50 mil exemplares vendidos, de acordo com a editora.

Elayne Baeta segurando seus dois primeiros livros próximos ao rosto enquanto sorri posando em um fundo branco; estrelas amarelas decoram a imagem
Elayne Baeta @elaynebaeta/Instagram/Reprodução

Para saber mais sobre seu processo de escrita, a CAPRICHO conversou com Elayne no evento e ela nos contou como começou O Amor Não É Óbvio: “Meu intuito escrevendo era ter algo, em algum lugar do mundo, não precisava nem ser publicado, mas ter um romance entre duas meninas que eu me enxergasse nisso e outras pessoas se enxergassem também”, relembrou.

Durante a conversa, Elayne também comentou a repercussão de Oxe, Baby e revelou que se surpreendeu com a resposta do público, já que se tratava da publicação de poesias muito pessoais e que não pensou que fossem se identificar tanto com o que foi escrito: “Você descobre que aquele dia que você mais se sentiu sozinha, foi o dia que outra pessoa mais se sentiu sozinha também. Nessa conexão, nenhuma das duas estava sozinha de fato, porque estavam compartilhando sentimento, apesar de não estarem no mesmo lugar“, destacou.

E se você já quer mais Elayne, pode se tranquilizar porque teremos um novo livro em breve! A escritora contou que está trabalhando em seu próximo lançamento e não pretende parar, podendo até mesmo se aventurar em novos gêneros no futuro: “Talvez eu me desafie em uns romances com uma pegada diferente, um romance misturado com algum outro gênero mas sempre no sentido de ter meninas se beijando nos meus livros e vivendo amorzinhos.”

Confira a nossa entrevista com Elayne Baeta:

CH: Primeiramente, como está sendo receber todo esse amor aqui na Bienal?

Elayne Baeta: Acabei de chegar e vim direto para cá! Ainda não tive contato com ninguém. Eu ia vir ontem, mas acabei não vindo, deixei pra fazer o elemento surpresa de vir hoje, que é a minha mesa com a Giu, Volp e a Maria Freitas. E eu acho uma delícia! Eu sou muito do contato físico, eu tento dar o máximo de atenção que consigo pela internet para as pessoas só que, pra mim, o pessoalmente sempre vale mais, é sempre mais gostoso. Eu publiquei O Amor Não É Óbvio no final de 2019 e, logo depois, veio a pandemia. Então, fiquei meio que privada de conhecer leitoras por um bom tempo e, agora que está voltando tudo, estive em Itu uns meses atrás e essa é a minha primeira Bienal de São Paulo pessoalmente. Eu já participei da Bienal de São Paulo quando aconteceu na pandemia, que foi a distância, mas eu nunca tinha participado da Bienal daqui. Essa é a primeira vez que estou vindo!

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CH: Como você disse, hoje você tem uma mesa com Stefano Volp, Giu Domingues e Maria Freitas sobre “Personagens LGBTs em Diferentes gêneros Literários“. Como está sendo estar aqui hoje para participar dessa conversa?

E: Eu acho muito importante que se façam mesas como essa e mesmo que a gente coloque mesas assim, ainda está pouco perto do que precisamos. Precisamos falar disso cada vez mais. Ainda são livros que mexem com camadas da nossa sociedade que se incomodam que eles sejam publicados, ainda mexem com estruturas muito problemáticas, falando social e culturalmente. Ter mesas como essa, que vão ser vistas por pessoas de diversas idades, opiniões políticas, de diversos nichos, é muito bom porque acabamos levando a mensagem para o público geral e, principalmente, pra gente jovem, que meio que é a alma de eventos como esses, que é a galera que lê mais assiduamente e para falar com esses jovens sobre a importância deles se verem nos livros diretamente.

Quando a gente publica um livro, ficamos meio que com um distanciamento. Eu escrevi na minha casa, vai para o papel, vai para a livraria e você compra. É um contato muito distante. O bom desses eventos é que você tem acesso direto ao seu autor, que escreveu um livro importante para você e que está ali para reivindicar o seu direito de ter mais livros como esse, de ter o espaço. Então, é uma cadeira que, quando eu sento pra falar sobre isso, sentada ali, estou representando várias pessoas. É de uma importância incalculável e espero que não pare por aí. Eu acho que a gente tem que ficar em cima mesmo, para que tenha cada vez mais mesas como essa. E não só mais mesas como essa, mas cada vez mais livros como esses, porque é disso que vamos falar hoje. É importante termos personagens assim na literatura.

CH: Agora, falando do Oxe, Baby, como foi o processo de escrita de um livro de poemas levando em conta que você já havia escrito seu livro de romance? O que foi mais complicado?

E: Escrever romance foi mais difícil! Porque eu sempre escrevi poemas, o romance veio depois. O meu romance foi meu primeiro livro publicado, mas eu já escrevia poemas desde antes, desde muito mais nova, desde antes de começar a escrever livros, eu já escrevia poesia, versinho de caderno. Tanto é que Oxe, Baby tem várias páginas de cadernos antigos meus impressos junto, e poemas da época que eu estava me descobrindo ainda, quando que eu era muito muito novinha. E eu sentei com minha editora e falei: “Poxa, eu tenho um livro de romance publicado, mas eu sempre escrevi poema, o que vocês acham de pegar todas as poesias que eu já tenho escritas em vários cadernos diferentes meus e misturar com poesias novas e a gente embalar tudo isso e fazer um caderno de poemas meu?”

Tanto é que Oxe, Baby segue essa linha de caderno de poemas, tem na lateral do livro: “Esse caderno pertence a Elayne Baeta, não abra!” É pra você se sentir meio que invadindo meu espaço, porque é meu espaço íntimo, sabe? A poesia é muito mais íntima do que um livro de romance, porque no livro de romance você está contando a história de um personagem que, apesar de ter influência sua, da sua personalidade, características e tal, ainda é mais distante. Você está criando alguém que está vivendo uma história. Na poesia, você está falando o que você sentia quando estava vivendo coisas específicas.

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Então, você acaba tendo acesso a um pedaço de mim que, normalmente, nem as pessoas do meu próprio convívio tem. É um livro muito íntimo e muito difícil de ser publicado nesse quesito de se abrir para outras pessoas, de botar um pedaço de mim no mundo, que nem todo mundo sabe, que nem todo tem acesso, da minha intimidade, da minha vida, de quando estava me descobrindo, quando eu estava no início da minha lesbianidade, de tipo: ‘Nossa, eu gosto de meninas e agora?’

CH: Já que você mencionou que é algo muito pessoal para você, como é ver outras pessoas lendo e se identificando com as suas palavras?

E: Isso era um medo meu! Eu ficava meio receosa, porque pensei: “Poxa, esse livro é muito íntimo. Talvez nem todo mundo vá conseguir se identificar com as coisas que coloquei nele porque está muito pessoal. Extremamente pessoal.” Em alguns poemas, eu descrevi detalhes muito minuciosos de coisas que vivi, inclusive, um dos poemas que eu mais recebi mensagem de feedback, foi um poema que eu pensei que só eu e a pessoa que passou isso comigo fosse entender. “Se ela comprar, ela vai entender, e eu, que estou publicando, estou entendendo”  E não! Foi o poema que mais recebi mensagens e fiquei pensando: Que maluquice!

A gente vive as coisas, a gente passa por um turbilhão de sentimentos achando que está passando por isso sozinha, tipo: “Só eu no mundo sei o que é isso, só eu no mundo estou sentindo isso. Acabou a história!” E quando você publica, vai para a livraria e vai alcançando pessoas, você descobre que aquele dia que você mais se sentiu sozinha, foi o dia que outra pessoa mais se sentiu sozinha também. Nessa conexão, nenhuma das duas estava sozinha de fato, porque estavam compartilhando sentimento, apesar de não estarem no mesmo lugar. Eu acho muito bonito isso porque conecta a gente de algum modo, né? Cria essa conexão, que a gente não sabe que está rolando, mas que está porque temos muito mais coisas em comum do que coisas diferentes, principalmente quando estamos falando de meninas que gostam de meninas.

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CH: Já que era mais fácil escrever poesias, como foi começar a escrever seu romance O Amor Não É Óbvio?

E: Eu estava cansada de ir na livraria e não achar livro. Começou assim. Estava com raiva já! (risos) Eu sempre gostei de ler só que depois que eu fui me descobrindo, eu queria ler algo que eu me identificasse. Estava cansada de ler só romance hétero. Eu sempre fui muito fã de livros de romance, era meu tipo preferido! Romance e poesia. Só que todo romance era hétero. “Era uma vez um menino e uma menina…” e isso foi me afastando da leitura, porque eu estava cansada de ler a mesma coisa, estava cansada das diferenças imensas e discrepantes que existem de um romance entre um menino e uma menina para um romance de duas meninas.

Eu ia nas livrarias e perguntava se tinham [romances com duas meninas] e diziam que não. Aí, fui me cansando e eu já gostava de escrever, escrevia desde a época do Orkut, amava escrever historinhas assim, então falei: “Vou criar uma de graça porque outras pessoas podem estar com a mesma vontade que eu, então vamos lendo juntos e vemos onde vai dar!” Deu no que deu! Foi no caminho para internet, para ser notado pela Record, para ser publicado, para estar na livraria, para virar um bestseller. Foi toda uma escadinha sendo subida, mas que eu não imaginava porque meu intuito escrevendo era ter algo, em algum lugar do mundo, não precisava nem ser publicado, mas ter um romance entre duas meninas que eu me enxergasse nisso e outras pessoas se enxergassem também. A publicação, ter virado um bestseller, tudo isso foi uma consequência que eu nem estava esperando, mas uma consequência muito bonita.

CH: Para fechar, já pode dar spoiler do seus próximos passos?

E: Eu já estou escrevendo, já tem livro para vir aí! Eu só preciso terminar porque sou lerda escrevendo. (risos) Mas eu já tenho um contrato de livro com a Record e pretendo continuar na linha de escrever romances entre meninas e continuar escrevendo poesia. Não vou abandonar nem um gênero, nem outro. Vou continuar botando no mundo livros desse tipo. E talvez eu me desafie em uns romances com uma pegada diferente, um romance misturado com algum outro gênero mas sempre no sentido de ter meninas se beijando nos meus livros e vivendo amorzinhos e poesia, porque me apaixonei. Escrevi muito na gaiatice e deu muito certo!


 

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