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PerifaCon: “Comic Con da favela” leva cultura nerd de graça às periferias

'É mostrar que na periferia a gente tem público e que a gente existe, que a gente quer coisas assim aqui também', explica um dos produtores.

Por Amanda Oliveira Atualizado em 4 dez 2020, 12h55 - Publicado em 27 mar 2019, 14h00

Se você gosta de ler quadrinhos, assistir a filmes de super-heróis e fazer cosplayprovavelmente também costuma frequentar eventos de cultura geek, como a CCXP, edição brasileira da tradicional Comic Con. Mas se você gosta de tudo isso e mora em uma região periférica de São Paulo, talvez não tenha condições de desembolsar, no mínimo, R$100 apenas para entrar na convenção – sem contar aqueles que vivem em outras cidades e outros estados. Por mais que esses eventos sejam grandes e acomodem muitas pessoas, eles definitivamente não são inclusivos. E foi exatamente por isso que a PerifaCon foi criada: para ser a ‘Comic Con das favelas’!

PerifaCon: a 'Comic Con da favela' que leva cultura gratuita às periferias
PerifaCon/Divulgação

Com ingressos gratuitos, a primeira edição da PerifaCon aconteceu na Fábrica de Cultura do Capão Redondo, bairro periférico de São Paulo, no último domingo, 24. Os organizadores esperavam no máximo duas mil pessoas, mas o público excedeu as expectativas: foram mais de 5 mil pessoas interessadas no evento! Durante a tarde inteira, até mesmo quando a programação já estava próxima do final, uma fila imensa de pessoas querendo entrar se formava pelo lado de fora do prédio. Matheus Polito, de 21 anos, um dos produtores da PerifaCon, conta que a iniciativa foi motivada pela falta de eventos com esse conteúdo que também contemplem o público das favelas. “Surgiu comigo e o Mateus Ramos conversando um dia sobre ter eventos gratuitos do ‘tipo nerd’ aqui e foi evoluindo com toda a equipe. À cada nova pessoa que entrava, uma nova ideia surgia, um novo conceito era adquirido ao evento”, diz em entrevista à CAPRICHO.

Das sete pessoas que estão envolvidas na produção, sendo que todas vivem em periferias paulistanas, apenas uma tem capacidade financeira de frequentar a CCXP, que tem ingressos entre R0 e R0, e um pacote de R mil. “Não é, jamais, ‘tirar o leito’ da CCXP. É só mostrar que a gente quer construir uma ponte com diálogos entre a periferia e esse tipo de consumo. Mostrar que na periferia a gente tem público e que a gente existe, que a gente quer coisas assim aqui também“, explica Matheus.

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Outro diferencial importante da PerifaCon é trazer o protagonismo negro para o universo nerd, como na primeira mesa de debate da edição: “Produção e Representatividade Negra nos Quadrinhos”. A artista visual Lya Nazura, uma das convidadas da roda de conversa, reforçou o ponto de que não basta apenas colocar um personagem negro no quadrinho, filme ou novela, como se fosse um “tapa buraco” para ninguém reclamar da falta de negros. “Toda a produção por trás é branca, toda a idealização é branca. Então, mesmo tendo a figura ali ou tendo uma história, toda a ideologia por trás não é contada por nós. Acho que a gente tem que ser mais crítico com a questão da representatividade, pra saber se aquilo é legítimo, porque eu vejo muita coisa que eu falo ‘não, gente, isso não me contempla'”, posiciona-se.

Lya tem 21 anos, mora na Zona Leste da capital e também trabalha com ilustrações que focam no protagonismo negro no universo geek e outras esferas majoritariamente ocupadas por brancos. Para ela, um evento como a PerifaCon permite que trabalhos assim sejam apresentados ao público, de uma forma não elitizada. “A PerifaCon faz com que a gente se sinta em casa e não se sinta deslocado nesses ambiente. Você ter um evento desse na favela só mostra que a favela tem cultura para produzir e pra consumir“, opina.

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Ilustrações, quadrinhos, adesivos e qualquer tipo de arte que você pode imaginar. Nas favelas, o que mais tem é gente produzindo, mas sem conseguir expor o trabalho para um público grande. Na CCXP, por exemplo, alugar uma mesa na área de expositores custa entre R$ 450 e R$ 3mil. Para quem mora em periferias, o custo é inviável – e mesmo quem juntar dinheiro por muito tempo ainda corre o risco de gastar mais do que lucrar. Por isso, o Beco dos Artistas, local dedicado aos expositores na PerifaCon, permite que os novos artistas apresentem seus trabalhos de forma gratuita e façam vendas acessíveis ao público.

A ilustradora Bianca Aguiar, de 24 anos, esteve como expositora na última edição da CCXP e, agora, na primeira edição da PerifaCon. Segundo ela, são eventos parecidos, mas muito distantes em alguns pontos. “É a mesma coisa, mas ao mesmo tempo é totalmente diferente. É a mesma coisa porque a galera que está no evento é a mesma, tanto os expositores quanto a galera que for vir aqui na minha mesa, eu posso imaginar que é a mesma ‘pegada’. Só que lá é dez vezes maior”, diz. Nas ilustrações feitas no computador, Bianca busca focar no protagonismo feminino em filmes, desenhos e animes, já que ela sempre gostou de obras consideradas “de meninos”. “Eu nunca me senti muito representada e a arte é a forma que eu tenho de mostrar e falar como eu me sinto em relação a isso“, conta.

Já a ilustradora e pedagoga Thaís Carvalho, de 24 anos, procura trabalhar com feminismo, empoderamento feminino e saúde mental em suas artes. “Ano passado eu tive um quadro de depressão muito profunda e foram as ilustrações que me ajudaram muito. E aí como eu sei que me ajudou, tento ajudar outras pessoas também“, conta. Para ela, a PerifaCon também é importante porque propõe dar mais visibilidade para os artistas dentro da comunidade, já que através das redes sociais é mais difícil.

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Só quem esteve na PerifaCon percebeu a importância de ter um evento assim. Definitivamente, cultura deveria ser um direito básico acessível para todos os públicos. Parabéns aos organizadores pela iniciativa única! Esperamos que mais edições aconteçam e alcancem outras periferias de São Paulo e de todo o Brasil. Esse é o universo nerd que a gente sente orgulho e deseja!

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