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Obrigar criança abusada a seguir com a gravidez não é pró-vida, é tortura

No domingo (16/8), um grupo antiaborto cercou o hospital em que a garota de 10 anos foi interromper a gravidez após autorização da justiça

Por Gabriela Junqueira Atualizado em 23 ago 2020, 11h04 - Publicado em 17 ago 2020, 16h07

Mais da metade das vítimas de estupro no Brasil em 2018 (53,6%), tinha menos de 13 anos, segundo o último Anuário Brasileiro de Segurança Pública. Entre essas vítimas, está uma garota de 10 anos, de São Mateus, no Espírito Santo. No começo de agosto, a criança capixaba passou mal e foi levada a um hospital, onde foi diagnosticado que ela estava grávida de cinco meses. Depois da gravidez ser identificada, a menina contou que era abusada pelo tio, de 33 anos, desde os 6 anos, e disse que não o denunciou antes porque ele a ameaçava de morte. O homem foi indiciado pela Justiça, mas segue foragido.

Elva Etienne/Getty Images

O Código Penal brasileiro concede desde 1940 o direito ao aborto em casos de estupro e dá respaldo para que a interrupção da gravidez seja realizada pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Na sexta-feira (14/8), a Justiça do Espírito Santo autorizou a realização do aborto. Inicialmente, ela seria atendida em um hospital do seu próprio estado, entretanto, a equipe médica do local se negou a realizar o procedimento. Por conta disso, a menina e uma parente precisaram viajar para Recife acompanhadas de um assistente social para que ela fosse tratada em um centro de referência de Pernambuco, que é especializado em situações como essa e no acolhimento das vítimas.

Por se tratar de um caso tão delicado, envolvendo uma criança, ele deve correr em segredo de justiça para preservar a menina. Entretanto, a manifestante de direita Sara Geromini expôs nas rede sociais o endereço do hospital em que a vítima se encontrava e também o seu nome. Em entrevista à revista FórumAriel de Castro Alves, membro do Conselho Estadual de Direitos Humanos (Condepe), disse que Sara Geromini “violou o direito ao respeito previsto na Constituição Federal e no ECA, e também está incitando um crime”. Ainda não foi esclarecido como a militante teve acesso às informações.

A Ilustração da artista @mairadraws ganhou notoriedade neste domingo após manifestantes antiaborto cercarem hospital @maiaradraws/Reprodução
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A divulgação das informações ocorreu na tarde do domingo e o hospital em que a criança estava foi cercado por manifestantes antiaborto que xingaram tanto a menina quanto a equipe médica de “assassinos”. Em um vídeo publicado nas redes sociais, uma jovem diz que estão fazendo isso para “salvar as duas vidas”. Vale lembrar que, além de ser consequência de uma violência, a gravidez era de risco, ou seja, seguir com ela poderia resultar na morte da menina. Preservar a vida não é forçar uma criança que sofreu estupro a continuar com uma gravidez de risco, o nome disso é violência e tortura.

Segundo o Fantástico, uma assistente social que atendeu a garota afirmou que ela ficava desesperada com a possibilidade de ter que seguir com a gravidez, chegando a chorar e a gritar. Manter a gravidez é um ato de tortura contra ela, é violentá-la novamente, é o Estado praticar uma violência tão grande ou maior do que ela já sofreu”, disse o obstetra responsável pelo caso, Olympio Filho, ao El País.

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No domingo à noite, após os manifestantes cercarem o edifício, um grupo de mulheres de Recife se reuniu na porta do hospital para defender o direito da garota realizar o procedimento. “Essa criança, depois de ser violentada, engravidou fruto desse estupro, e os fundamentalistas estão aqui para dizer que a vida dela não importa. Para colocar a vida de uma menina de 10 anos em risco”, disseram em coro.

“Nós estamos aqui, em um contexto de pandemia, respeitando o isolamento social, usando máscara, para dizer que nossas vidas importam e que a vida dessa menina estuprada importa para toda essa sociedade. (…) Gravidez aos 10 anos é morte“, concluíram.

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Nesta segunda, após iniciar o processo na última noite, a garota conseguiu interromper a gravidez. De acordo com a coordenadora de enfermagem do hospital que realizou o procedimento, ela ficará em observação e, caso tudo corra bem, terá alta na terça-feira. Depois da repercussão do caso, Whinderson Nunes  e Felipe Neto se comprometeram a ajudar a criança. O humorista ofereceu apoio psicológico para a menina até os 18 anos, enquanto o YouTuber disse que pagaria seus estudos.

Como citamos no início dessa matéria, das 66 mil vítimas de estupro no país em 2018, mais da metade eram meninas com menos de 13 anos. O Código Penal considera estupro de vulnerável como a conjunção carnal ou crime libidinoso contra menores de 14 anos ou pessoas que não possam oferecem discernimento ou resistência, resultando em pena de 8 a 15 anos de prisão. Ser a favor da vida é garantir que todos os direitos das crianças e adolescentes sejam preservados e que eles sejam protegidos – e não expôr e obrigar uma criança, vítima de tantas violências, a seguir com uma gravidez.

Para denunciar um caso de abuso, disque 100. A ligação é gratuita e o serviço funciona 24 horas por dia, durante toda a semana.

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Comportamento
Obrigar criança abusada a seguir com a gravidez não é pró-vida, é tortura
No domingo (16/8), um grupo antiaborto cercou o hospital em que a garota de 10 anos foi interromper a gravidez após autorização da justiça

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