ocê já parou para pensar o quanto a sua infância ainda tem influência na sua vida e nos seus relacionamentos? O psicanalista John Bowlby analisou os vínculos criados entre os bebês e seus cuidadores (mãe, pai, avós ou outros responsáveis) desde o comecinho de suas jornadas e como isso afetava a dinâmica das suas relações até na vida adulta. Assim ele desenvolveu a chamada “Teoria do Apego”.
Daniela Boecker, psicóloga do INBRACER (Instituto Brasileiro do Cérebro), explica que a essência dessa teoria está em como a qualidade dos vínculos formados na infância influencia na forma em que o indivíduo percebe se suas relações são seguras ou não.
A partir dessa ideia, a Teoria do Apego classificou diferentes tipos de apego, divididos entre seguro e inseguros. Daniela explica os principais deles, com exemplos.
Apego seguro
Cuidadores que são sensíveis aos sentimentos e necessidades das crianças contribuem muito para que esse indivíduo cresça e construa seus afetos com equilíbrio. Pessoas que desenvolvem o apego seguro são capazes de construir relações saudáveis e com flexibilidade.
Apego inseguro evitante
O apego inseguro evitante é marcado por um mecanismo de defesa que está sempre em busca de manter distância de vínculos e afetos, baseando-se na autossuficiência. Seu grande medo é se vincular com alguém e sofrer. “Não é regra, mas geralmente esses comportamentos são reflexos de cuidadores muito rígidos ou ausentes e lares em que o afeto não é tão evidente”, exemplifica a psicóloga. Essas pessoas tendem a se dedicarem excessivamente ao trabalho, por exemplo, já que ele não demanda uma relação afetiva.
Apego inseguro preocupado
Nesse caso é o oposto do evitante e apresenta um perfil ansioso demandante. São pessoas que precisam ter alguém a qualquer custo, já que não conseguem ficar sozinhas. “Geralmente, a origem é uma família que nutre um zelo excessivo e que os membros criam uma relação de dependência entre eles”, explica Daniela, enfatizando que trata-se de um exemplo e não de uma regra. “Esse perfil demanda muita atenção e acaba sufocando o outro dentro do relacionamento”, completa.
O que é modo de funcionamento interno?
É comum que pessoas que desenvolveram apegos inseguros acabem vivendo em um ciclo de desequilíbrio: os evitantes toda vez fogem de qualquer relacionamento mais profundo, enquanto os demandantes pulam de uma relação para outra, sem nem pensar se é isso mesmo que querem. Isso pode acontecer muitas vezes, mas não quer dizer que seja uma condição eterna, tá?
A Teoria do Apego diz que esse modo de funcionamento interno, que vai sendo estabelecido desde o início da vida, não é fixo. Isto é, ele vai se atualizando no decorrer da vida, de acordo com as relações que vamos experimentando. “Você pode, sim, se cuidar e reparar as relações tóxicas que viveu, inclusive na infância, e construir relacionamentos saudáveis e com dinâmicas diferentes”, explica.
Em outras palavras, isso quer dizer que você pode, sim, aprender com suas experiências amorosas, sejam elas boas ou ruins, e ir moldando o seu modo de funcionamento para chegar o mais perto de um equilíbrio.
Enquanto sua personalidade diz sobre suas características que pouco mudam ao longo da vida, o modo de funcionamento trata-se das ações e comportamentos que podem ser modificados no decorrer do tempo.
Daniela Boecker
Como a teoria do apego pode te ajudar a olhar para suas relações
É interessante você, leitor e leitora da CH, já olhar para isso nessa fase da sua vida. Afinal, é na a adolescência que vamos nos desprendendo do mundinho fechado da infância para construir nossa própria existência e as relações ficam mais diversas e complexas também.
“Já na adolescência é possível observar a qualidade dos vínculos. Ao começar a se relacionarem amorosamente, os jovens podem reforçar o que aconteceu na infância, positivo ou negativamente, ou já começar a repararem algum desequilíbrio nesses apegos”, diz Daniela.
Além disso, quando você está em uma relação, é importante entender seus próprios padrões de apego e da pessoa que está do seu lado. A psicóloga diz que vale entender se o que a outra pessoa pode oferecer é o suficiente para você e se suas expectativas estão alinhadas. Imagina os conflitos que podem surgir, por exemplo, se alguém que tende a ter apego evitante se relacionar com um perfil demandante? “Não existe um par perfeito, mas existe alguém que dá um match melhor”, diz Daniela.
A dica da especialista é ter a sensibilidade de observar como o parceiro ou parceira se comporta, quais são os gostos, se o outro gosta de ser acionado o tempo inteiro ou não, se é mais reservado ou extrovertido, se o outro tem capacidade mais fluída para demonstrar afeto ou não. Tudo isso são dicas para entender a relação. Mas o mais importante, segundo Daniela, é: não depositar no outro as nossas próprias demandas de felicidade.