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O dia em que eu descobri que poderia estar com câncer de mama

'Será que aquele carocinho, no auge dos meus 25 anos, era um tumor? Caraminholas invadiram minha cabeça e não saíram dali tão cedo.'

Por Isabella Otto Atualizado em 25 out 2018, 16h29 - Publicado em 25 out 2018, 16h28

Em 2016, eu era uma pessoa hipocondríaca. Sim, eu achava direto que estava com alguma doença grave. Qualquer coisa que sentia corria para o Google (olha que perigo!) e o buscador sempre comprovava minha maior teoria: eu ia morrer. Afinal, ou era isso ou era gravidez! (risos nervosos) Foi um ano bem complicado, em que eu vivia no médico e lutava contra paranoias criadas na minha cabeça. 2016 foi um dos anos mais incríveis da minha vida, mas também um dos mais assustadores. Eu precisei reunir muita coragem para não me deixar levar. Não sei até hoje se foi uma fase, se eu tive sorte ou se não tive uma crise tão aguda assim, só sei que as coisas melhoraram. Acho que, em parte, isso se deve ao fato de que, não importa o quão “noiada” e pessimista sejamos, sempre achamos que o pior nunca vai acontecer com a gente.

Adehoidar/Getty Images

Sempre tive muito medo de ter câncer. É uma das doenças que mais me assusta, não vou negar. Lembro de ser criança e ver uma tia de segundo grau lutar bravamente contra um câncer de mama, que voltou depois de alguns anos, se minha memória não falha. Eu era pequena e não entendia direito o que estava acontecendo. Foi também durante a infância que descobri que um primo estava com leucemia. Foi justamente na época em que a novela Laços de Família estava sendo exibida pela primeira vez na Rede Globo e Camila (Carolina Dieckmann), a protagonista, era diagnosticada com a doença. “Meu primo vai morrer?” foi a primeira pergunta que fiz para a minha mãe, que prontamente respondeu: “é claro que não”. Aquilo me sossegou. Afinal, era a minha mãe falando! Mães sempre têm razão, certo? Mais tarde, minha avó paterna foi diagnosticada com câncer de mama. Dessa vez, não tive medo. Nunca achei que minha avó fosse morrer disso. Ela era forte, então sabia que ia superar. E ela superou! Hoje, está com 91 anos de idade, e faz uns 20 anos que ela passou pelo tratamento e precisou retirar uma mama. Como já era idosa, optou por não fazer a reconstrução.

Mas por que eu estou contando tudo isso? No começo deste ano, enquanto passava creme no corpo e aproveitava para dar aquela apalpada básica e necessária nos seios, percebi que tinha um carocinho ali. “Epa!”, foi a primeira coisa que passou pela minha cabeça. Depois, lembrei que minha mãe tem alguns cistos benignos na mama e me tranquilizei. Não devia ser nada. Estava prestes a tirar férias, viajar, aproveitar a vida! Deus não ia me mandar uma bucha dessas, né? Mesmo assim, chamei minha mãe e mostrei a “bolinha”. Ela disse que não devia ser nada, mas que, passando, a viagem, deveria ir ao médico. “Mas só depois, vai que é alguma coisa?”, disse.

“Vai que é alguma coisa”. Há uns dois anos, essa frase ficaria martelando insacavelmente na minha cabeça e, muito provavelmente, eu teria aproveitado bem menos minha viagem. Este ano, contudo, consegui fazer a Elsa e “let it go”. Pelo menos, durante o mês em que viajei. Ao voltar para São Paulo, marquei uma consulta com uma médica ginecologista. Contei para ela que tinha sentido um carocinho no seio direito, mostrei onde, ela apalpou, apalpou, disse que eu tinha razão, que realmente tinha uma coisinha ali e falou: “vou pedir um ultrassom com punção”.

“EPA!”, passou de novo pela minha cabeça, mas agora em Caps Lock. Eu sabia o que era punção. Ah, isso eu sabia! Minha avó precisou fazer punção, minha tia também. Na minha cabeça, pedir punção era comprovar que algo de muito errado estava acontecendo. Quando cheguei em casa e mostrei o pedido do exame para a minha mãe, ela também estranhou. “Ultrassom já com punção? Nem pediu uma mamografia antes?”, estranhou. Lembra de toda a crise hipocondríaca que tive lá em 2016? Pois bem, ela voltou no mesmo instante.

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Arquivo Pessoal/Reprodução

Sabe quando você não tem motivo para isso, mas acha que está grávida, começa a reparar em várias mulheres grávidas que passam por você e entende que isso é um sinal do universo? Na semana em que descobri que precisaria fazer o exame, acompanhei minha mãe em uma festa de aniversário e conheci uma mulher carequinha que estava fazendo quimioterapia. O motivo? Câncer de mama. Como ela descobriu? Ela sentiu um carocinho no seio e a punção deu o veredito. Gelei. Será que o cosmo estava querendo me dizer alguma coisa? Será que aquela “bolinha”, no auge dos meus 25 anos, era um tumor? Caraminholas invadiram minha cabeça e não saíram dali tão cedo.

A punção foi bem difícil para a minha avó. Não sei se é porque já tinha mais idade, mas ela sofreu muito. Chegou toda enfaixada em casa e dolorida. Essa lembrança fez eu “dar um Google” e descobrir várias coisas sobre o procedimento: de YouTubers que já haviam feito e não sentido nada a mulheres anônimas que se queixavam de terem ficado com a marca do bisturi no seio. A verdade é que não havia nada muito claro sobre o exame.

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No fatídico dia, estava surpreendentemente tranquila. Não tinha jeito, né? Ou eu era corajosa ou era corajosa. Não tinha outra opção. O médico realizou o ultrassom primeiro e depois disse que ia fazer a punção. A “arminha de disparo” é um pouco assustadora, por ser meio grande e com uma agulha relativamente grossa e comprida na ponta. Mas o que mais assusta mesmo é o barulho que ela faz quando dispara e perfura o cisto. Para fazer a biópsia, tomei uma injeção anestésica. Ela foi mais dolorida que a própria punção. É bastante incômodo sentir a agulhinha fina perfurar o cisto. Mas não foi nada insuportável e o médico foi me explicando tudo, o que me acalmou bastante.

Arquivo Pessoal/Reprodução

Três disparos foram feitos com a “arminha” da punção. Ou seja, três vezes tive a pele perfurada no mesmo ponto. Uma vez dentro da pele, eu sentia que o doutor perfurava o cisto em diferentes pontos. Ele auxiliava o procedimento com a máquina de ultrassom. Depois, ele colocou muita gaze sobre o seio e fez um curativão. Tinha tanta gaze que até pesava! Os cuidados? Não tirar o sutiã nos três dias seguintes, nem para dormir, tomar cuidado no banho, para não molhar o curativo demais, e só tirá-lo depois de três dias. O esparadrapo que estava por baixo, menorzinho, poderia ser retirado depois de cinco dias.

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No final, percebi que, mais uma vez, a fila da montanha-russa foi mais assustadora que o próprio brinquedo. Meu seio ficou dolorido por algumas semanas e ficar sem sutiã era impossível. Talvez, por ser grande, meu seio fazia força para baixo e repuxava o cisto, que estava claramente machucado. A manchinha roxa saiu depois de um mês e a marquinha da agulha, hoje, quase quatro meses depois do procedimento, nem aparece mais.

Você deve estar se questionando: “tá, mas o que deu o resultado?”. O nódulo é benigno. Não é câncer. A médica explicou que, antes dos 30 anos, é muito difícil que o cisto seja maligno. O Dr. Fábio Muniz, ginecologista, obstetra e mastologista do Hospital e Maternidade São Cristóvão, que foi consultado por mim para a realização desta matéria, confirma a informação: “é importante deixar claro que até 80% dos tumores mamários palpáveis são alterações benignas e que não aumentam de maneira significativa o risco para desenvolver o câncer de mama. O câncer tem ainda outras formas de manifestação clínica, como descarga papilar, erosão do mamilo, nódulo em axilas, abaulamento ou retrações da mama”, explica.

Arquivo Pessoal/Reprodução

De seis em seis meses, preciso voltar à ginecologista para checar o nódulo – e, é claro, continuar fazendo o autoexame em casa. Foi um susto e tanto! Não é fácil viver com a hipótese de que você pode estar com câncer. Os dias parecem ter 72h. As semanas parecem levar meses. O antes do exame é terrível, a espera é angustiante, e o depois também não é nada fácil. Ninguém quer receber uma notícia ruim. É por isso que vim aqui. Na verdade, resolvi contar minha história por duas principais razões: desmistificar o terrorismo que causa a palavra punção e contar para você que o autoexame pode começar a ser feito em casa por volta dos 20 anos de idade.

“Embora o câncer de mama seja pouco comum entre jovens, durante a consulta ginecológica, é importante que o médico de sua confiança identifique situações anormais, que em geral estão associados a condições benignas, tais como fibroadenomas, cistos e as alterações fisiológicas da mama durante o ciclo menstrual(…) O câncer de mama hereditário tem como característica o aparecimento em mulheres jovens abaixo de 40 anos, mas estudos comprovam que cerca de 5% a 10% dos casos têm em sua base uma composição genética familiar“, esclarece o Dr. Fábio, que ainda completa dizendo que menos de 1% de todos os casos de câncer de mama ocorrem antes dos 30 anos de idade: “a idade em que se manifesta com mais frequência é entre 50 e 70 anos”.

Cuidar de si mesma é empoderador. Apalpe seus seios e tenha coragem para encarar seus nódulos, qualquer que seja o resultado. Você é mulher, afinal de contas. Você é forte. Uma guerreira por natureza. Você consegue! 

 

Isabella Otto é jornalista, repórter de comportamento da CH, feminista e faz parte da corrente A.M.E. (autoestima, mental health e empoderamento) da CAPRICHO.

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