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Não é não? Casos de assédio ainda dominam bloquinhos de Carnaval

'Os caras invadem meu espaço e a nervosinho sou eu?', questiona foliã.

Por Isabella Otto Atualizado em 11 fev 2018, 14h00 - Publicado em 11 fev 2018, 14h00

Em agosto de 2016, a CAPRICHO começou a campanha #GirlPowerCH. Foi nessa época que termos como feminismo começaram a chegar com mais força para as adolescentes. Desde então, cada vez mais matérias passaram a ser feitas e assuntos como assédio sexual tornaram-se pautas em almoços de família.

iStock/ArthurHidden/Reprodução

O esperado era que com mais debates do tipo tendo cada vez mais alcance, os casos de violência contra a mulher diminuíssem. Desde 2016, muitas campanhas foram feitas. Ousamos dizer que este Carnaval é o que mais tem ações contra o assédio nas ruas. A campanha “Não é não”, idealizada pelas amigas Barbara Menchise, Aisha Jacob, Julia Parucker e Nandi Barbosa, prega a conscientização por meio de tatuagens temporárias. A mensagem, contudo, parece não estar chegando para algumas pessoas – e outras, mesmo tendo conhecimento dela, parecem não querer ouvir. Barbara Canavês, de 17 anos, integrante da Galera CAPRICHO, mora em Dois Córregos, no interior de São Paulo, e garante que essas campanhas não chegam por lá. Ela já teve que defender uma amiga que estava sendo visivelmente assediada em um bloquinho enquanto ninguém fazia nada.

A jornalista Aline Fernandes presenciou uma triste cena ao ir embora do bloco Acadêmicos do Baixo Augusta, um dos mais populares de São Paulo, cuja mensagem é sempre de tolerância e contra o machismo. “Era por volta das 21h e, perto da praça Desembargador Mário Pires, vi um rapaz que aparentava uns 20 e poucos anos segurar uma moça pelo braço e começar a falar bem perto do rosto dela. No começo, não dava para entender se eles se conheciam ou o que estava acontecendo. Mas logo ela começou a balançar a cabeça negativamente e o cara a prensou em umas grades que separavam a multidão do carro de som. Nisso, uma amiga da garota veio resgatá-la. Ela puxou a amiga pelo braço, mas o agressor não a soltava. A menina começou a gritar até que, por fim, o rapaz a deixou ir. Poucos metros depois, havia um carro de polícia parado, mas aparentemente os policiais não perceberam o que havia acabado de acontecer”, conta.

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Fabiana Piasentin passou por uma situação parecida, mas, no caso, ela foi a vítima. “Voltando da casa de uns amigos, por volta das 20h30, estava sozinha no Largo da Batata, em São Paulo, quando um grupo de seis caras me abordou. Estava a maior confusão, porque o metrô estava fechado e não passava ônibus. Os homens estavam fantasiados de dado e insistiram para que eu jogasse um dadinho que eles tinham em mãos. Para resolver o assunto logo, visto que eles não me deixavam ir embora, joguei a pocaria do dado e saiu o número quatro. Quando fiz que ia embora, eles me cercaram mais uma vez e queriam a todo custo que eu beijasse o cara que estava com o número 4 na camiseta. Naquele momento, pensei: ‘pronto, virei estatística’“, recorda a consultora de imagem. Sentido-se acuada, Fabi começou a gritar para que eles abrissem passagem. Depois de pressionar, o grupo finalmente se movimentou, mas não sem antes a chamar de nervosinha. “Os caras invadem meu espaço e a nervosinha sou eu?”, questiona a foliã, que tinha curtido os blocos Arrianu Sassunga e Amélie Pulando antes do ocorrido.

No bloco Baixo Augusta, Aline viu algumas mulheres usando a tattoo do “não é não”, mas nos bloquinhos menores Fabi não viu ninguém. Julia Santos, de 18 anos, curtiu o pré-Carnaval no bloco Casa Comigo, na região da FAria Lima, em São Paulo, e também não viu muitas pessoas participando da campanha. “Me separei das minhas amigas para ir ao banheiro e acabamos nos desencontrando. Comecei a andar no meio das pessoas, para tentar encontrá-las, quando esbarrei sem querer em um menino. O bloquinho estava lotado, então era impossível não esbarrar nas pessoas. Mas na cabeça do cara eu tinha esbarrado nele de propósito, porque queria chamar a atenção. Continuei andando, mas ele segurou meu braço com muita força e começou a dizer coisas do tipo: ‘provocou, agora vai aguentar’. Ele não me largava de jeito nenhum, tentava me beijar e passar a mão em mim. Mandava ele parar e me soltar, porque só queria encontrar minhas amigas, mas ele não me deixava ir. As pessoas ao redor não fizeram nada além de rir”, conta a foliã.

Reprodução/Reprodução
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Para Julia, casos do tipo só a deixam cada vez mais desanimada de curtir o Carnaval. “Essas coisas tiram completamente minha vontade de participar da festa, sem falar no medo que eu tô de ficar em lugares muito cheios. E se um dia acontecer algo pior?”, lamenta. Bianca, de 19 anos, que prefere não ter o sobrenome identificado, sente medo por ela e pela irmã mais nova, de 15 anos, que está descobrindo os bloquinhos de rua agora. “Rola preguiça, porque sei que quero ir só para dançar, mas vou ter que acabar lidando com algum cara chato. Tanto é que minhas amigas e eu combinamos sempre de andar em bandos. É engraçado que, quando digo que namoro, os caras logo vão embora ou pedem desculpa. Homem respeita o que é de outro homem, mas não respeita a vontade da mulher“, afirma a universitária, que fica inconformada com esses meninos que ainda tratam as mulheres como propriedade e/ou objeto.

Para nós, que vivemos dentro de uma bolha, campanhas anti-assédio já estão mais do que consolidadas. Para o resto das pessoas, principalmente aquelas que tomam atitudes machistas e agressivas como as descritas acima, “assédio não existe, é frescura”. Por isso, é necessário que debates do tipo e movimentos feministas façam ainda mais barulho! Aline acredita que a cena lamentável que viu no Baixo Augusta é a prova viva de que não podemos baixar a guarda totalmente e que essas campanhas são importantíssimas. Fabi Piasentin concorda: “a gente vive em uma sociedade muito machista, mas, se voltarmos uns anos, perceberemos que ninguém nem falava sobre o assunto. Então, mesmo que tais campanhas ainda não causem muitos efeitos, se uma mulher tiver sido respeitada por um homem que ficou sabendo que ‘não é não’, já saímos ganhando“, garante.

Depois do não, tudo é assédio!

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