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‘Na Síria, vivi guerra. Na Jordânia, dor. No Brasil, vivo paz’

Aos 15 anos, Hanan Dacka dá voz aos jovens refugiados sírios que chegam ao Brasil com medos e traumas, mas cheios de esperança no coração.

Por Isabella Otto Atualizado em 8 mar 2018, 12h55 - Publicado em 8 mar 2018, 12h54

Em 1530, o primeiro fluxo migratório aconteceu no Brasil. Portugueses vieram e dominaram o que, para eles, era uma terra nova. Os anos passaram e novas ondas de imigração ocorreram. Em meados de 1800, suíços e italianos vieram para o país atraídos pela lavoura de café e pecuária. Em 1908, foi a vez dos japoneses. Mais tarde, alemães e húngaros, com medo da 1ª Guerra Mundial, fugiram para o Brasil. Não é de hoje que refugiados encontram paz em território brasileiro. Dessa vez, sírios recomeçam longe de casa, em um país cuja língua, cultura e religião são diferentes. É o caso de Hanan Dacka, uma jovem refugiada que chegou ao Brasil há três anos.

Reprodução/Reprodução

A adolescente tinha uma casa grande em Idlib, cidade síria que fica perto de Alepo. No jardim, sua mãe plantava temperos e verduras para o consumo da família. Todos tinhas quartos. Hoje, Hanan mora em um apartamento de um cômodo em São Paulo, com o pai, a mãe, o irmão mais velho, a caçulinha e a avó. Na Guerra Civil Síria, a jovem de 15 anos já perdeu muitas pessoas próximas. Várias foram para campos de refugiados antes de tentarem a sorte em outros países. Outras se recusam a deixar o país árabe e preferem viver em meio ao sofrimento, à incerteza e ao caos. “No meu país, você pode matar uma pessoa e ser perdoado, mas você não pode insultar o Presidente Bashar Al-Assad“, revolta-se.

A rotina de Hanan Dacka mudou muito em pouquíssimo tempo. A casa dela em Idlib já não existe mais. Foi bombardeada. Ela também já morou por alguns anos em um campo de refugiados na Jordânia. Toda a família vivia em uma tenda, para usar o banheiro era preciso caminhar 30 minutos, e comida e água eram itens escassos. A garota perdeu seu “melhor tio” para a guerra. Ela aprendeu na marra um idioma totalmente novo. Ajudou outros refugiados sírios recém-chegados ao Brasil. Foi chamada de mulher- bomba só porque usa véu. Trabalhou como tradutora voluntária em hospitais brasileiros. Batalhou para ganhar uma bolsa de estudos, pois não queria parar de estudar. E ela só tem 15 anos.

À esquerda, Hanan com a sua avó, que fala poucas palavras em português. À direito, ela com sua irmã mais nova, que nasceu no campo de refugiados na Jordânia. Reprodução/Reprodução
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Minha avó se casou com 13 e fica falando que eu estou ficando velha. Credo!“, falou Hanan depois de gravar o vídeo para a CAPRICHO. Ela também conta que não pensa em se casar tão cedo e quer, primeiro, estudar bastante. Malala Yousafzai é uma inspiração para a refugiada, que também é muçulmana e batalha para que meninas tenham direito à educação e sejam livres.

Liberdade de escolha é algo muito importante para a adolescente. Ela, na maioria dos dias, usa véu (ou, se preferir, hijab). Mas ela também pode não usar. “É uma coisa da minha cultura, da minha religião. Não é obrigatório. É uma escolha nossa“, garante a muçulmana.

A cultura islâmica é muito diferente da cultura brasileira. É natural que sintamos curiosidade ao nos deparar com uma mulher usando burca em pleno shopping ou, então, que questionemos algumas coisas, como o fato de muitas mulheres árabes ainda não poderem andar na rua sem ter um homem ao lado. Não dá, porém, para dizer o que é certo ou errado, ou culpar os muçulmanos por uma guerra que está matando tantos inocentes – muçulmanos, inclusive.

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Reprodução/Reprodução

Hanan Dacka diz que a guerra na Síria começou por causa de um professor, que pichou nas paredes da escola em que dava aula ofensas ao Bashar Al-Assad. A notícia chegou aos ouvidos de tropas armadas que defeniam o governo, que foram atrás do culpado. No fim, uma criança acabou levando a culpa e sendo morta. Há várias versões de como tudo começou, mas o motivo é sempre o mesmo: luta política. Enquanto uns apoiam o governo de Al-Assad, outros lutam contra ele. Armas de fogo são usadas, há brigas de conquistas territoriais, governos de outros países se tornam ou não aliados, até que, em determinado momento, ninguém sabe mais por que estão brigando. Essa é a grande verdade e nós já vimos essa história antes.

“Não acho que vai parar tão cedo”, lamenta a jovem síria, que sente saudade de casa, mas não pode voltar porque (1) sua casa já não existe mais, (2) seu pai está jurado de morte, pois ajudou amigos sírios a fugirem do país e (3) quando lembra-se da Síria, só pensa em dor e sofrimento.

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Mesmo longe de sua cidade natal, Hanan está lutando por seu povo, dando entrevistas, contando seu lado da história, ajudando jovens refugiados, sendo uma inspiração para outras meninas sírias. Ela não só faz a mudança. Ela é a mudança. E cabe a nós transformarmos ao lado dela.

A síria Hanan Dacka é mais uma das protagonistas do #betheCHange, projeto da CAPRICHO que conta a história de garotas que estão mudando a realidade em que vivem. Curta, compartilhe, debata, seja a mudança!

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