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Israel x Palestina: as guerras, o conflito em Gaza e a cobertura midiática

Entenda os confrontos no Oriente Médio tendo como base fatos históricos e o ponto de vista de jornalistas, palestinos e israelenses

Por Isabella Otto Atualizado em 20 Maio 2021, 14h34 - Publicado em 20 Maio 2021, 14h33

Entender o conflito entre Israel e Palestina não é mesmo fácil. Além de ser antigo, várias batalhas aconteceram ao longo dos anos que contribuíram para moldar o constante estado de tensão no Oriente Médio. A seguir, você encontra um guia para entender melhor a guerra entre os Estados e os porquês dela ocorrer.

Imagem de uma explosão em prédios da Faixa de Gaza
Explosão causada por ataques aéreos israelenses vista em prédios ligados ao movimento Hamas Mohammed Talatene/picture alliance/Getty Images

Como tudo começou

No final do século XIX, o sionismo foi instituído na Europa, movimento que defendia a criação de um Estado para todos os judeus. Idealizado por Theodor Herzl, jornalista austro-húngaro que publicou um livro sobre o tema em 1896, ele foi uma resposta ao antissemitismo que sempre existiu e se tornou ainda mais pulsante durante a 2ª Guerra Mundial (1939 a 1945), com o holocausto. Estima-se que seis milhões de judeus tenham sido mortos durante o Nazismo. Por isso, a necessidade um “lar nacional” depois de 1945 era tão urgente.

O local escolhido para a criação desse lar ficava entre o Mar Mediterrâneo e o Rio Jordão, só que era uma área não apenas sagrada para os judeus, como também para os muçulmanos e os cristãos. No final da 2ª Guerra, estima-se que mais de 600 mil judeus já ocupavam a região do Oriente Médio que hoje corresponde a Israel, onde se encontram Jerusalém, Cisjordânia e a Faixa de Gaza.

O Estado de Israel foi oficialmente decretado em 1948, após o fim do Mandato Britânico da Palestina.

O que foi o Mandato Britânico da Palestina e no que ele culminou

A Grã-Bretanha passou a controlar algumas regiões do mapa depois da 1ª Guerra Mundial, que terminou com a vitória dos aliados da França e a derrota da Alemanha. Entre essas regiões, estava a Palestina, que foi tomada dos turcos-otomanos pelos britânicos. “Judeus e árabes viviam no território que hoje corresponde a Israel até o fim do século XIX, quando a região fazia parte do antigo Império Otomano. Mas o Império foi vencido e dominado na 1ª Guerra pelo que conhecemos como a Tríplice Entente [Reino Unido, França e Império Russo, na época]. Não havia a ONU e sim a Liga das Nações, que determinou que o território ficasse sob comando da Grã-Bretanha. Então, em 1920, eles assinaram o Mandato Britânico“, explica a jornalista Gabriela Franco, de ascendência judaica, que destaca que através da existência de um Estado próprio, os judeus poderiam se reagrupar e ser fortes, o que é algo extremamente importante para um povo praticamente nômade, que sofreu violentas perseguições durante séculos.

“O Mandato Britânico, em tese, era um instrumento para garantir a coexistência de ambos os povos em um mesmo território, porém ganhou contornos difusos ao longo do tempo. Com o crescimento do povo judeu no local e o apoio e ânsia por um Estado Judeu vindo de poderosas famílias judaicas em toda a Europa, a Grã-Bretanha se viu em uma sinuca de bico. Com medo de perder o apoio dessas famílias, o ministro de assuntos exteriores da época, Arthur James Baufour, escreveu uma carta prometendo aos sionistas algo bem difícil de se cumprir e sobre o qual a Grã-Bretanha não tinha controle algum: criar na Palestina um ‘lar nacional’ para os judeus viverem em segurança, sem violar os direitos dos árabes que já moravam ali. Nem é preciso dizer que os árabes, que contavam com o apoio da Grã-Bretanha na garantia de seu espaço, se sentiram traídos com a tal Declaração de Baufour e fizeram uma revolta em 1929, a primeira de uma sucessão infinita na região”, contextualiza.

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Depois de um cenário de puro caos, com grupos de guerrilha judaicos atacando árabes e britânicos, e judeus chegando à “Terra Prometida” por vias extraoficiais, a Grã-Bretanha decretou o fim do Mandato Britânico da Palestina e “jogou o problema” na mão da recém-criada ONU, que surgiu em 1945.  A organização propôs então a criação de um estado independente para os judeus, outro para os árabes e sugeriu ainda que Jerusalém fosse um Estado Particular, já que era um local sagrado para todos. Apesar de aprovado, o plano nunca foi colocado em prática.

Um tanque de guerra com a bandeira de Israel aguarda no meio do nada, na fronteira entre Israel e Gaza
Um tanque israelense parado na fronteira entre Israel e Gaza, perto de Sderot Ilia Yefimovich/picture alliance/Getty Images

A Guerra Árabe-Israelense

Em maio de 1948, alguns países árabes declararam guerra ao recém-oficializado Estado de Israel, entre eles Egito, Iraque, Jordânia, Líbano, Síria e Arábia Saudita, que formavam a Liga Árabe. Com o apoio dos Estados Unidos, Israel não só venceu a guerra (para eles, intitulada Guerra da Independência) como expandiu seu território (ocupando 75% da Palestina), passando a controlar a parte ocidental de Jerusalém. A Faixa de Gaza ficou sob o comando do Egito.

Esta primeira grande guerra foi o estopim para outras, mas conflitos armados já ocorriam na região desde quando os primeiros judeus começaram a ocupar parte da Palestina. Estima-se que 750 mil palestinos precisaram fugir de suas casas durante a investida.

Muito engana-se quem pensa que essa guerra se deu por razões religiosas e territoriais apenas. Motivos econômicos também foram decisivos, já que o povo palestino passou a ocupar regiões que não possuíam ligação por terra, dificultando o comércio, por exemplo. Em 1956, uma crise no Canal de Suez iniciou um novo conflito armado, dessa vez entre Israel e Egito. Esta empreitada culminou na Guerra dos Seis Dias.

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Guerra dos Seis Dias

Entre 5 e 10 de junho de 1967, ocorreu a Guerra dos Seis Dias, que terminou novamente com a vitória de Israel (que lutou contra Egito, Síria e Jordânia), que expandiu ainda mais seu território, passando a incorporar também as áreas da Península do Sinai, Faixa de Gaza, Cisjordânia, Colinas de Golã e a área oriental da cidade de Jerusalém.

De acordo com a professora de História Juliana Bezerra, que trabalha como redatora no site Toda Matéria, “a Guerra dos Seis Dias marcou uma nova fase no conflito entre judeus e palestinos, pois os palestinos começaram a ter consciência de sua própria força e identidade. Por outra parte, centenas de milhares de refugiados palestinos passaram a viver em territórios ocupados sob domínio israelense”.

O conflito armado terminou com o pedido de cessar-fogo emitido pelo Conselho de Segurança da ONU, que foi acatado Israel, Jordânia, Egito e Síria, respectivamente. Ao todo, estima-se que quase 20 mil pessoas tenham sido mortas e outras seis mil tenham sido presas.

Guerra do Yom Kippur

Em 1973, Egito e Síria se uniram novamente contra Israel, numa guerra motivada principalmente por causa da anexação de territórios sírios e egípcios por Israel durante a Guerra dos Seis Dias, como a Faixa de Gaza e a Cisjordânia. O derradeiro ataque ocorreu em 6 de outubro, durante o Dia do Perdão, feriado judaico conhecido como Yom Kippur.

Israel teve significativas baixas durante conflitos no Canal de Suez, mas acabou se recuperando na contraofensiva, detendo o exército egípcio e adentrando o território sírio, atingindo Damasco, capital do país. Depois de 20 dias de constantes ataques armados, a ONU, os Estados Unidos e a até então União Soviética emitiram um pedido de cessar-fogo, que novamente foi acatado.

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Três fatos importantes se sucederam após a Guerra do Yom Kippur:

  1. Israel não devolveu os territórios que havia ocupado na Guerra dos Seis Dias;
  2. países árabes grandes produtores de petróleo boicotaram aqueles que defenderam Israel, restringindo a venda de barris, derrubando bolsas de valores e iniciando a famosa e mundial Crise do Petróleo;
  3. o fato de Israel não ter devolvido os territórios ocupados em 1967 e de palestinos estarem vivendo em regiões controladas pelo exército israelense deu visibilidade à Questão Palestina e a Yasser Arafat, líder da Organização para a Libertação da Palestina, que faleceu em 2004, não sem antes ganhar um Nobel da Paz pelos seus esforços em estabelecer a paz no Oriente Médio.

Conflitos de 2014

Durante a Guerra dos Seis Dias, Israel ocupou a Faixa de Gaza e não a devolveu após a Guerra do Yom Kippur. Logo, defende que seja território do Estado. A Palestina, contudo, também defende que Gaza seja território dos palestinos. Além de questões religiosas, estão em jogo o controle do Rio Jordão e do Mar Mediterrâneo. Tudo isso fez com que em 2014 explodisse um dos conflitos mais sangrentos na região.

Uma garotinha está no meio de escombros, em uma rua de Gaza, com o que restou de alguns ursinhos de pelúcia destruídos pela guerra
Em Gaza, criança recolhe dos escombros o que restou de alguns de seus brinquedos Ahmed Zakot/SOPA Images/LightRocket/Getty Images

Ele teve início no Verão, em 12 de junho, com o rapto e o assassinato de três estudantes israelitas. O crime foi respondido com o homicídio de um jovem palestino no final do mesmo mês. Aí foi, literalmente, tiro e bomba para todo lado, sendo que a batalha começou por ar e depois passou a ser por terra também. Entre os soldados, a vivência de dezenas de milhares de civis, de ambos os lados, ficando desabrigados, tendo que viver como refugiados e sendo mortos.

Em 8 de julho, teve início uma operação israelita chamada Margem Protetora, que intensificou ainda mais os conflitos. As Forças de Defesa bolaram um plano e passaram a atacar a parte de Gaza controlado pelo Hamas, que atua na região desde 2007.

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As Forças de Defesa de Israel e o Hamas

As Forças de Defesa de Israel (FDI) nasceram em 1948, com o intuito de defender a soberania e a integridade territorial do Estado de Israel, detendo inimigos e ataques terroristas, como eles mesmo colocam, por céu, terra e mar. Todos os homens e mulheres elegíveis do país são convocados aos 18 anos, sendo as FDI um serviço obrigatório.

Garotinho palestino ajoelhado no chão, com as mãos nas laterais dos olhos, com cara te desespero
Garoto se encontra catatônico durante funeral do seu parente, Salama al-Nadeem, de 32 anos, membro da segurança do Hamas Majdi Fathi/NurPhoto/Getty Images

O Hamas foi criado na segunda metade da década de 1980, em oposição à Organização pela Libertação da Palestina, liderada por Yasser Arafat, que tentava pregar a paz no Oriente Médio reconhecendo o Estado de Israel e encontrando soluções a partir disso. O Hamas, contudo, nega a existência do Estado de Israel e de qualquer organização ou país que a ela defenda.

Em 2006, durante eleições na Faixa de Gaza, o partido político foi eleito pela maioria, tendo assumido o poder no ano seguinte. Para os que consideram o Hamas uma organização terrorista (oficialmente, os Estados Unidos, a União Europeia, o Japão, Israel e Canadá. A Austrália e o Reino Unido consideram terrorista apenas o braço militar da organização, as Brigadas Izz ad-Din al-Qassam. O Brasil ainda não considera o Hamas como terrorista), o que ocorreu foi um golpe de Estado – apesar da legitimidade das eleições -, justamente porque, na visão deles, o terrorismo não é legítimo nem quando escolhido pelo povo. Um dos grandes aliados internacionais do Hamas é a Turquia – lembrando que a região da Palestina ocupada pelos turcos-otomanos foi tomada pelos britânicos após a 1ª Guerra.

Conflitos de 2021

Em 1876, as comunidades judaicas Sephardi e Ashkenazi compraram terras no bairro de Sheikh Jarrah, pois consideravam o local sagrado. Hoje, uma série de colonos judeus reivindica na Justiça imóveis que foram construídos nessas terras, que atualmente são ocupados por palestinos, devido às consequências da guerras acima citadas, dizendo que as casas, originalmente, pertencem à comunidade judaica.

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Para deixar o clima ainda mais tenso, o político ultranacionalista Itamar Ben-Gvir, filiado ao Partido Sionista Religioso, da extrema Direita, montou uma tenda na rua principal de Sheikh Jarrah como forma de protesto, avisando que os judeus iriam tomar Sheikh Jarrah dos palestinos, que começaram a ter suas casas invadidas e saqueadas.

A crise atual também foi marcada por investidas de Israel contra os palestinos durante o Ramadan, um dos principais feriados do calendário islâmico. O Hamas respondeu e, em uma semana, atacou as Forças de Defesa de Israel com mais de três mil foguetes. Israel então respondeu com mais de mil bombardeios aéreos e ataques por terra, inclusive por uma rede de túneis. Dentre as principais vítimas, novamente, os civis. Enquanto uma negociação de cessar-fogo ainda é vista como prematura, o que ocorre é uma comoção mundial pelos palestinos, que estão sendo expulsos de suas casas.

Manifestantes da causa palestina em rua de Nova York. Ela está lotada. Um deles segura um cartaz com os dizeres:
Ativistas da causa palestina em manifestação na 2ª Avenida, em Nova York, nos EUA Spencer Platt/Getty Images

A cobertura da mídia

Assim como o Partido Sionista Religioso, o Hamas também é extremista, contudo, na maioria das vezes, apenas o lado muçulmano é tratado como terrorista. Hyatt Omar, estudante de Psicologia e ativista pela causa palestina, acredita que isso seja motivado pelo preconceito e pela intolerância religiosa. “Não podemos definir a questão palestina ao Hamas. Hamas teoricamente foi um partido político eleito em Gaza, assim como Fatah na Cisjordânia. Isso de maneira alguma quer dizer que concordo com o que acontece, mas não se pode ignorar a violência, brutalidade e ocupação da Palestina, principalmente na Cisjordânia”, pontua. A estudante Fatimah Anuar, de 16 anos, que mora no Paraná, acha que a questão do terrorismo é “extremamente generalizada” e dá o exemplo: “Quando um muçulmano faz algo de errado, nunca é só tratado como homem, mulher, estudante, pessoa, é sempre tratado como muçulmano, como se aquilo mudasse tudo. Não dá para culpar toda uma religião [por casos pontuais]“, desabafa.

Do outro lado, Aline Szewkies, guia brasileira de turismo, que mora em Jerusalém, diz que os conflitos atuais não são entre Israel e Palestina, mas entre Israel e o Hamas, “grupo terrorista que está atacando Israel e Israel está defendendo sua população. Aliás, a população árabe do Estado também está sendo atacada”. Para ela, boa parte das críticas a Israel tem uma origem antissemita, principalmente quando as mesmas pessoas que criticam o Estado são as mesmas que ignoram as outras mortes do Oriente Médio, inclusive de árabes e muçulmanos, como as que estão ocorrendo neste instante na Síria e no Iêmen, por exemplo. “São pessoas que já têm um ódio enraizado aos judeus e procuram agora justificativas para o seu ódio. Críticas a Israel podem ser feitas. Como todos os países, temos nossos problemas, mas Israel evita, sim, a morte de civis em Gaza”, dá seu parecer.

Aqui, é legal entender que judeu e israelense são termos distintos. Judeus são aqueles que praticam o judaísmo, tendo eles nascidos dentro da religião ou se convertido à ela, e descendem de duas principais tribos de Israel: Judá e Benjamin. A maior comunidade judaica fica em Israel e a 2ª maior nos EUA. Já os israelenses são aqueles que têm cidadania de Israel e moram no Estado, mas não necessariamente são judeus, ou seja, seguem a religião ou derivam dessas tribos.

Para a jornalista Gabriela Franco, veículos de comunicação colocam oprimidos como opressores parte por causa da visão imperialista estadunidense, apoiadora incondicional de Israel. “Se observarmos bem e aplicarmos um olhar questionador sobre os fatos históricos, as ações dos EUA no Oriente Médio e na América Latina não foram visando a liberdade de tais países de forças opressoras ou quaisquer que fossem os motivos alegados, mas sim por interesses econômicos. Como os estadunidenses são muito poderosos em termos midiáticos, uma versão enviesada dos fatos acaba chegando ao resto do mundo. Não à toa Israel bombardeou o principal canal de notícias do mundo árabe, o grupo Al Jazeera, e atingiu também outra agência importante, a Associated Press, um grupo independente de mídia estadunidense”, contextualiza.

“Quando a mesquita de Al-Aqsa, em Jerusalém, foi invadida em maio, não teve relação com o Hamas. Quando tivemos um palestino morto dentro dela, não teve relação com o Hamas. Por isso, acho importante destacar que, quando se fala de opressão, estamos falando das violações de Israel de leis internacionais e direitos humanos, da expulsão de palestinos de suas casas, do muro ilegal na Cisjordânia, entre outras”, completa ainda a ativista Hyatt Omar. Aline Szewkies acredita que os sangrentos conflitos armados só chegarão ao fim com uma negociação de paz, como aconteceu no último ano, em que quatro países de maioria mulçumana decidiram fazer a paz com Israel (os Emirados Árabes, Barém, Sudão e Marrocos). “A gente fica muito triste vendo o sofrimento dos palestinos, é claro, mas a única maneira de fazer esse conflito terminar é conseguir uma negociação de paz. É o pessoal do Hamas e os grupos terroristas palestinos abaixarem suas armas e decidirem que eles querem fazer a paz com Isarel”, opina a judia, que torce para que isso aconteça: “Temos que fazer mais negociações como os Acordos de Camp David, firmados em 1979 entre Israel e Egito. Aí sim, no futuro, se Deus quiser, vamos ter uma paz longa e duradoura”.

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