No último dia 25, a polícia foi acionada em Minneapolis, nos Estados Unidos, por um funcionário de uma loja que disse que um cliente havia dado uma nota falsa de US$ 20 a ele. O homem em questão era George Floyd, de 46 anos. Policiais logo chegaram ao local e, nas imagens seguintes, que viralizaram na internet, George já estava imobilizado pelo joelho por um dos policiais, Derek Chauvin, dizendo que estava com dor no estômago e que não conseguia respirar. A autoridade continuou a asfixiá-lo até a morte. O assassinato de George Floyd desencadeou uma onda de protestos nos Estados Unidos e no mundo.
Eis que um movimento contrário ao da luta antirracista surgiu nas redes sociais nesse meio tempo: o “Desafio do George Floyd”. A ideia é reproduzir a cena do assassinato do homem negro e postá-la na internet com a hashtag #GeorgeFloydChallenge. Todas as imagens postadas até então foram feitas por jovens brancos, que claramente zombam do ocorrido. Por razões óbvias, não compartilharemos essas imagens aqui.
“Eu estou sem palavras”, “isso é horrível” e “eu preciso sair deste planeta” foram alguns dos comentários dos usuários do Twitter que se indignaram com as postagens, doentias, revoltantes e um retrato claro do racismo estrutural em nossa sociedade. O jornal The Sun foi o primeiro veículo a dar as imagens do desafio.
Em seguida, a foto foi compartilhada no grupo da Universidade de Warwick. O jornal afirmou que, inicialmente, foi informado que os adolescentes iriam começar a estudar na instituição, o que explica a postagem no grupo. Um colega da escola em que os adolescentes estudaram negou a informação. Pelo o que foi apurado, acredita-se que os jovens, com idades entre 18 e 19 anos, frequentaram a Escola Católica Cardinal Hume e são da cidade de Gateshead, na Inglaterra, lugar em que frequentemente crimes racistas são reportados, como é possível ver em reportagens publicadas na mídia.
Em uma matéria publicada depois pelo The Post, um porta-voz do Facebook declarou ao jornal que a rede estava ciente do desafio e removendo todas as postagens com a hashtag por violarem os padrões da comunidade e por encorajarem outras pessoas a “participarem de um desafio viral de alto risco”.
A morte de Geoge Floyd não é um caso isolado. Minneapolis, no estado de Minnesota, é uma das cidades norte-americanas com maior índice de desigualdade racial. Segundo o jornal The Washington Post, uma família branca ganha em média, durante um ano, o dobro do que uma família negra recebe no mesmo período.
As condições de desigualdade também estão presentes quando o assunto são os imóveis da cidade. De acordo com Kevin Ehrman-Solberg, geógrafo e fundador do projeto Mapping Prejudice, da Universidade do Minnesota, “isso [o assassinato de George] não foi algo aleatório (…) é o resultado de décadas e décadas de desigualdade estrutural“, disse para a BBC News Brasil.
Para se ter uma ideia, no começo do século 20, uma cláusula estabelecia que pessoas que não fossem brancas não poderiam comprar imóveis em certas regiões de Minneapolis. Uma clara herança da segregação racial nos Estados Unidos, que resite até hoje e não apenas no Sul no país. “Os negros foram empurrados para determinados bairros da cidade. E, mesmo com o número de habitantes negros continuando a crescer, faixas cada vez maiores da cidade ficaram totalmente brancas”, aponta o Mapping Prejudice.
A propriedade é uma das formas de acúmulo de capital e, segundo o projeto, até hoje, “Minneapolis tem a menor taxa de proprietários de casas afro-americanas no país”, dado que mostra a disparidade de propriedade entre brancos e negros. “A diferença de riqueza racial dificulta a erosão da segregação residencial e contribui de todas as formas para as disparidades raciais na educação, nos resultados de saúde e no emprego que a comunidade hoje enfrenta“, conclui o projeto.
O maior desafio de tantas pessoas representadas pelos adolescentes de Gateshead é reconhecer seus privilégios em uma sociedade em que brancos são privilegiados apenas por serem brancos, e não mais ficarem impunes perante atitudes racistas. Racismo é crime e o genocídio negro não é “desafio viral de alto risco” (viu, Facebook?).